segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

3 graus negativos.

O inverno desta terra é obscuro. E não é obscuro porque é assim que, na maioria das vezes, eu me sinto. É obscuro porque o fumo que eu vejo sair das casas de madeira, é feito de gente. Amanhã - sem sombra de dúvidas - anunciarão no noticiário das oito que mais alguém morreu carbonizado pela sua própria lareira. Que alguém desmaiou para cima das madeiras em chamas. Quem um senhor tropeçou num dos pés do sofá e nunca mais se levantou. Ou então, que o fumo que vemos das nossas janelas, não é causado pelas fábricas, nem por incendiários criminosos. O negrume que nós vemos, é consequência de uma queda. De um pequeno tropeço que poderia ter sido evitado se a perna do sofá fosse voltada para dentro. E de um pequeno atrevimento. Se não se tivessem levantado, hoje eu não respiraria o odor nauseabundo que - dia sim/dia não - invade esta cidade.
Aqui, inspiram-se almas queimadas. E eu transpiro o cheiro delas. Amanheço com os olhos pedrados e tudo me cheira a incêndio. Mesmo que chova lá fora. Mesmo que do outro lado da estrada neve. Mesmo que ninguém se queime, eu amanheço chamuscada pela combustão das lareiras.
Para mim, o inverno é sinónimo de corpos torrados no meio da sala. Mas há quem goste do perfume do inferno. Desta miscelânea de odores pestilentos inconfundíveis às narinas dos que já morreram. Há quem goste, e quanto a isso eu não posso fazer nada.

Um comentário:

Jean Valjean disse...

Esta é a Cosette que eu conheço há muito: de fortes imagens, melífluas metáforas, cérebro robusto, coração candente, ei-la que ressurge, fênix, das cinzas virtuais, cintilante e bela.
Astonished,