segunda-feira, 26 de abril de 2010

"Inconvivível"

Assim como o Antônio Rogério Magri criou o neo(i)logismo "imexível", estou criando o meu: "inconvivível".
É o c* da minhoca: à medida que o tempo passa eu vou me tornando mais insuportável. Está difícil conviver comigo. Às vezes acordo pela manhã, olho minha imagem incongruente no espelho e já fico invocado. As sobrancelhas grossas, a testa cada vez maior (deve caber chifre à beça nela, tá?), o nariz que parece uma batata doce cozida, a boca que parece um morango passado.
Quanto ao humor, acho que nem preciso falar: eu e meu ego andamos lutando por espaço na cama, que já não nos comporta a ambos, embora seja de casal.
Esta porcaria que trago no meio das pernas ainda serve para fazer xixi, e por isto devo ser grato à Mãe Natureza, pois daqui a um tempo...
Havia um amigo meu, ex-seminarista (hoje ele já não está entre nós), que atingiu um momento assim tão chato e triste da sua vida, que começou a comprar sapatos apertados, só para ter um prazer: tirar os sapatos, quando chegasse à sua casa, à noite.
Que tipo de prazer posso dar a uma mulher, hoje em dia? Sei lá: sair de cima, lavar a louça, fazer um rango, de vez em quando. Ah, tomar um banho, também - afasta o mau-cheiro que me assola os pensamentos.
E por falar em pensamentos, os meus são nefastos: morceguinhos voam ao redor deles, querendo sugar-lhes a (falsa e pútrida) essência.
Do tobogã da vida, já estou eu quase embaixo. Olha, não é embaixo tipo no fim da descida, não. Já acabei de descer e agora estou para me esconder sob o tobogã, ou seja, debaixo dos traseiros - sejam eles gordos, magros, estufados, chapados, retilíneos ou curvos - que vão passar sobre a minha cabeça.
Sempre fui um trapalhão. Nunca esqueço uma vez em que comecei um estágio, e tinha de usar gravata. Nervoso, naquele dia tive de ir ao banheiro - era uma repartição pública. Uma dor ventral daquelas que maltratam a gente. Uns espasmos estranhos. Parecia que ia nascer um bebê (e olhem que eu nem estava grávido). Comecei a respirar pela barriga, firmar o diafragma e nada. Tudo bem, entrei no sanitário e lá não teve jeito: parto natural, com direito a barulheira - a bateria da Beija-Flor, da Mangueira, da Unidos dos Engravatados, tudo fora do ritmo, tudo tão banal, tão humano e desairoso...
Ao fim, aquela coisa maravilhosa: dar uma limpadinha básica no fiofó. Comecei sentado e, para o serviço ficar mais perfeito, levantei. Peguei o rolo de papel higiênico nas mãos, e por algum motivo alienígena o desgraçado me escapou dos dedos e foi ao chão. Quando abaixei para pegá-lo, tooomeeee, Jean Valjean! Lá estava a sua gravata MERGULHADA NA PRIVADA. Da ponta à metade!
Dia agourento. Acabei de limpar a cauda, tirei a gravata, joguei no lixo e saí do "banho" (gostou, Cô?) suando frio e tremendo: de cansaço, de irritação, de ... sei lá mais do quê.
Na repartição, o chefe me pergunta de minha gravata. "Sabe, Sr. Raphael, derrubei mostarda nela, e não consegui limpar. Joguei fora." E ele, brabo e indignado: "Amanhã traga duas gravatas, pois aqui, sem gravata é igual a sem emprego."
Ops!
De lá para cá, o que mudou em minha vida, fora as desilusões, as desesperanças e a triste realIDADE que vem com a real idade? Acho que nada, senão que estou mais chato e também que aprendi a não mergulhar a gravata na m*...
C'est ça.

7 comentários:

Cris Medeiros disse...

Seu mal é mesmo mal que me assola... PENSAR DEMAAAAAIS... Toda pessoa que pensa demais acaba um dia nessa encruzilhada de se achar o esgoto do mundo... Esses dias passam e dias melhores aparecem, mas dias maus voltam... rs... E assim a vida segue... Acho que o grande barato é tentar estar bem o maior tempo possível...

Beijocas e melhoras pro seu humor... Ahhh! Eu acho que tb sou inconvivível... rs

Cosette disse...

Putz, eu preciso realçar a parte em que me matei de rir? Acho que não.
Ora tio, quer coisa pior do que depois de tudo isso, você ter arranjado uma sobrinha ainda mais desregulada do que os teus espasmos intestinais? Ninguém merece!

Sim, eu li o texto todo, mas quanto a tua infeliz introdução, eu não vou dizer nada. Conversa já não adianta, hoje só te espancando.
Hahahahaha!

Já sabes, quando te aparecer um estagiário sem gravata, não dê bronca no rapaz...
Um beijo!

Cris Medeiros disse...

Sobre seu comentário em meu blog:

Olha eu trabalhei de forma voluntária em um hospital com transexuais (mulheres que nasceram aprisionadas em corpos de homem). Fiz amizade com algumas na época e pude perceber o quanto aquilo não é escolha, mas sim condição e o quanto a sociedade as punia por aquilo. Acho até que sofriam muito mais discriminação que os homossexuais...

Na minha cabeça não entra que a pessoa não possa ser dona dos seus desejos, do seu corpo e da sua sexualidade! Sempre vou lutar pra que a discriminação diminua!

Beijocas

Jean Valjean disse...

Dama, agora vou contar um segredo para você (talvez imperdoável hahahahaha): sou ADVOGADO!
Sim! E por muito tempo exerci meus ofícios na Procuradoria do Estado, em casos de família e de uniões estáveis, tanto hetero quanto homofílicas (hoje ditas homoafetivas). O que me espantava era o seguinte: o casal gay vivia junto fazia 15 anos. Um deles estava com AIDS, câncer, diabético em estado terminal, etc. O outro cuidava dele até o último dia de vida. As famílias de ambos os rejeitavam, fingiam que não conheciam, abandonavam. Só que ambos juntavam um capital X, e quando um morria, a família, até então sumida, aparecia lá para pegar todo o dinheiro. Nosso papel, àquela época, era provar que o capital havia sido construído pelo casal, e que a família não podia, de jeito nenhum, levar tudo.
Naqueles idos de 1988 e 1989, convivi com essa txurma e lá encontrei as mais lindas histórias. E foi lá que entendi que não é o corpo que determina o que somos, mas sim o mundo interior. É por isso que eu digo que às vezes há, sim, um espírito masculino preso num corpo feminino, e vice-versa. Só quando a gente convive é que passa a entender certas coisas.
É isso!
Abreijos!

Cris Medeiros disse...

Pois é Jean! Acontece isso mesmo, a família vira as costas para o homossexual. Ele batalha, conquista seus bens, se une a um companheiro e quando morre vai tudo pra aquela família cretina! Eu já vi isso acontecer algumas vezes! Meu segredinho é que trabalho no Tribunal de Justiça... ehehe

E olha! Você ser advogado não influencia em nada o que acho de você, mesmo sabendo o que sinto pelos advogados... eheheh

Beijocas

Jean Valjean disse...

Sobrinha, acho que consigo adivinhar em que momento você riu, e me parece que até cheguei a ver uns dentes aí atrás desses lábios fechados, sô! É verdade? Você tem dentes? Tem covinhas? Noooosssaaaaa!
Você é mega-equilibrada, tudo de bom. Quanto à minha introdução, ela é simplesmente... realista!
Abreijos, dear dearest!

Lully L. disse...

Fiquei curiosa quando vi seu comentário no blog da Dama de cinzas. O pseudónimo me atraiu e quis saber como seria o blog de um admirador de Victor Hugo.Gostei do blog e amei esse post...rsrsrs
Ah, tem pessoas em que o mau humor é comico, acho que é o seu caso e isso é muito bom, por isso não acho que seja uma pessoa inconvivível.
bjs